Rosh Hashaná está chegando

         Setembro 2020, Rosh Hashaná já está chegando, vai ser tudo diferente, sem sinagoga, sem família perto. Só na tela. Não preciso tirar pratos, pratas, toalhas e o pensamento sem trabalho voou longe e trouxe de presente o setembro da minha infância. Era assim!

         A preparação era melhor que a festa. Começava na véspera com carnes, frangos e peixes intimados a comparecer para uma primeira vistoria. E lá vinham as bacias de ágata brancas e enormes, as panelas maiores brilhantes de tão areadas, as tábuas e facões para destroçar aquelas peças.

         Era também a vez do bolo de mel e dos temperos penetrarem nas carnes: alho, cebola, cebolinha, orégano, louro, vinho, sal, azeite, pimenta do reino e da vermelha.

         Forno e fogão a todo vapor, a casa inteira inundava na mistura dos cheiros do bolo de mel assando e atraindo abelhas com o caldo de galinha exalando salsão e dill e da vitela se afogando no vinho.

         Uma porção de mulheres enchia a cozinha - minha avó Fany, minha mãe, minha tia Civia, a Nira e eu. Era uma farra. Elas cantavam, falavam e riam suadas. Pareciam feiticeiras, picando, virando, mexendo e transformando coisas mortas e duras em comidas deliciosas.

         Eu experimentava de tudo e ficava observando o movimento. Minha missão era descascar e fatiar maçãs e peras para a compota com frutas secas e ajudar a arrumar a mesa.

         Limpar frango, picar cebola, tirar espinhos do peixe, descascar batatas, todo esse trabalho era feito em alguma hora oculta para mim.

         Fui protegida pelas minhas mulheres que tiravam do meu caminho qualquer espinho e lágrima.

         Fui crescendo abençoada por elas, ganhando coragem, me encontrando. Ah, como foi bom viver cercada pelas minhas mulheres!